terça-feira, 29 de maio de 2018


SEMIOLOGIA, DEMÊNCIA E OUTRAS DESAVENÇAS.
Ele, senhor da criação e do conflito, não se fez de esnobe e muito menos tentou circunscrever o infinito em pequenos preconceitos como se o azul não estivesse dando apoio ao firmamento ou as ideias pré-concebidas. A dialética não se contradisse até então, pois, tanto como sabia se impor, era deus e não devia satisfação a ninguém. Assim foi dito por tais e quais apesar dos paradoxos aceitos e acatados, como se pediu ser registrado pelas melhores pitonisas e confirmou-se sem reservas o nascimento do cosmos e outras intolerâncias. Os ribombares dos tempos badalaram como se fossem os carrilhões para deixarem o futuro rebrotar e deus paciente e sábio, cuspiu suas mágoas do lado em que a tristeza estava mais desabrigada, olhou o horizonte, que se pretendia lindo, a maré estava na montante, como preferia ele para praticar em sustenidos as delicadezas das suas artes e manhas, dividiu a esperança em pequenos bocados de lágrimas, empertigou-se entre uma circunferência altiva, mas sem preconceitos, desfolhou os recalques de uma lagartixa lésbica para encantar a grandiosidade do dia da criação e a luz se fez. Coisas simples, imprevisíveis, desconhecidas, sinceras, mas altaneiras.
Simultaneamente, até aonde se permitira, estendeu suas vistas que enxergavam o futuro, o passado, a incógnita e a solidão, se dispôs a criar divinamente, deus, o mundo em sete compassos indefinidos da escala de sol maior, embora em colcheias e semibreves na plenitude de suas submissões, reservando um último compasso, mas eloquente, para a preguiça. Tudo com o intuito de não afrontar outros desaforos. As pitonisas anotaram, aplaudiram e definiram que as cores preferidas seriam o medo, a ingratidão e a porventura. Neste entremeio, com relação às rebeldias, enquanto imaginava como ocupar-se para matar o tempo e ter com que se distrair, deus achou uma aplicação ao barro sobrando, apesar das lavaredas do inferno secando, utilizou a massa argilosa para infernizar com o sopro da vida o homem, criar o pecado, irritar a mulher e começar a fazer história, politica e psicanálise. Fundamentos da loucura que salvaria a humanidade, embora sem saber do que, até então. Só mais tarde é que o tempo e o espaço se definiram como intransigentes e os deuses da angústia, da demência, da depressão assumirão seus papeis de destaque. Foi assim por descuido e, pela evolução da espécie, segundo Darwin, renasceu o pobre menino envolto em paranoias, rememorou suas tristezas enquanto se defendia da mãe histérica por causa do édipo. Esta a origem da subjetividade, do contraditório e da luta de classes. 
O infinito começou a se fazer poente para enfeitar o firmamento. A logica ocupou seu espaço para impor ao homem o sofrimento. O sonho foi proibido para que ninguém fugisse a suas rotinas. Era sábado e cada de si que se dava por gente ser escondeu suas tristezas envoltas em um copo de vinho, talvez um sorriso de complacência, quiçá um pedaço de cinismo. Fingiria que era alegre e se confortaria com a solidão. O menino preparou as boas mágoas tecidas para distribuir melancolias entre os mais chegados e deixou os sinos alongados levarem os devaneios para os seus inconscientes. Sábado, a deus coube esperar o domingo de graças, rezou em silêncio.
Ceflorence   25/04/18     email   cflorence.amabrasil@uol.com.br 

sexta-feira, 25 de maio de 2018


VERSO EM PÉ DE SERRA
De tratos e tempos não se formam os verbos, pois, a desandarem as ideias solteiras em cabeça de viajante infernado nas rasteiras das poeiras e tropas de muladas axucradas, nunca se deu de apaziguar as mágoas, só pela cadência da viola andejadeira. Atente moço, se quiser saber os definitivos quando o sermão coruscar pelos lados das maldades e dos verdes com os ventos corriqueiros trazendo notícias das coisas bravas, não se arremede ou acanhe de perguntar. Aquelas foram igualadas às mesmas pragas que zangavam entre as pedras miudicas, por onde sapecavam as cismas mais entranhadas de ver o saci enrodilhado nos rodamoinhos das encruzilhadas. Ali havia sido assassinado homem de descrença nas fés e matador por conta de mandado de terceiros, mas merecera cruz por ordens dos mandantes. Coisas dos sertões e outras tangentes sem explicação. Deus me perdoe se desfalo despropositados sem melindres, mas é como sei verbar no desacato quando a corruíra canta em sustenido solfejando esconditiva na beiradinha da mata fechada.  
Coisas nem do tinhoso retrucar nos sovados. Foi assim, por desconjuro; o azul veio rodeando pelos cantos dos horizontes, cambaleando sem saber como pousar nas desforras, mas o grilo calou no fundo da capoeira rala, até a serra ser atravessada pelos pesadelos e liberou por aqueles cantos tristes o sombreado do sol que se punha para amoitar na preguiça. Ameaçou de chover, mas o remédio não se deu e nem proveio de imediatamentes como o vento sabia caminhar, pois não desaprendeu sozinho andar devagoroso como se pedia, mas cuspia carrancudo do lado da refrega. Prosa mole, sem destinado? Talvez. Aquilo era um esturvião de indecências e motivados des-explicados. Apaziguou o cavalo passarinheiro na porta da venda, fez gesto de proseador e coragem e amorteceu o rabo-de-tatu no sovaco da retranca. Por desmotivo, cambaleou as pernas hirtadas e se fez de indiferente, apeando do animal suado. Coisas de nem se acreditar de tão tinhoso. Prosa de deus com o demônio em roda de truco, lugar onde as coisas não se fazem por varejo mesmo para quem não tem destino certo.
Os que já estavam não descreram de suspender a pinga, menos ainda o truco, a retaguarda do amedrontado nem se fala e olharam de soslaio como se fossem carenciados dos perjúrios mais salgados a ser pedido nos palmeados do catira que continuou travado ou desameaçaram de desfazer os sinais das cruzes corretas por desmotivos das intempéries que ameaçavam, mas não vinham. Mas não se deu nem por justiça e não foi merecido de serventia adjacente. O homem abençoou refrega e apaziguou no desmonte. Coisa de não prevenir.
Foi como chegou a conversa na boca da noite, cada um se calou de si para ficar sem falar e o lampião de querosene continuou fumegando, pois ninguém teve coragem de sair da retranca com medo de que a desforra viesse no encalço da solidão.   
Ceflorence   17/04/18     email    cflorence.amabrasi@uol.com.br

terça-feira, 22 de maio de 2018


E POR SER SERÁ
O sol castigava de manso os passos calmos de Joca no aconchego do sozinho. Acomoda-se para enfiar isca para dourado sabido, que vinha driblando seus critérios de conhecedor das artimanhas dos matreiros. Nascera e fora criado naquelas bandas e margens de rio, acasalou com Rosinha, vizinha dos aconchegos, com os conformes todos dos flertes, das flores e das vergonhas pensadas e das apalpadas, enterrou pai e cuidava da mãe, educou filharada forte e sadia e sabia que seu destino e suas necessidades estavam arribando nas chegadas horas que as águas corridas contavam. Olhou o tempo manso dos temperamentos das corredeiras sabidas aonde se lê os futuros e as intenções dos porvires. Joca chegara da Venda do Cato e seguiu direto para a ceva gorda da curva brava, na esperança de arrematar as pendências com o peixe caprichoso, com quem se havia em teimas há mais dos esquecidos.
            Por que pescava na mesma rotina branda e viciada, no mesmo lugar e por tantos janeiros? Antes de se saber gente, acompanhava o pai repondo o jacá de milho na mesma ceva. Ali era o ponto de encontro com seus consigos mais íntimos, das tratativas de conformar as realidades dos passados com esperanças dos futuros. As águas corridas são exatamente a vida, ruminava Joca. Aquelas já passadas, que seguiram destino acabado, deixaram marcas boas e más para preencher um presente no qual se pesca os desejos, as realidades, os valores, as posses, as ambições, os afetos, as raivas e, para não ir mais longe, as imaginações todas que crescem, querendo ou não, nestes pensamentos xucros que fantasiavam as manias. Pretendia criar os destinos, mas as águas encharcavam o futuro nas correntezas por onde restava deixar correr a canoa e remar da proa para não emborcar com as marolas.
Acorda Joca, ponha sentido no rio e na vara solta. Fisgou o dourado, dá linha para que o tranco não arruíne a estorva e arrebente. Ali se forma uma dupla singular, unívoca, em que o jogo é imaginar o próximo lance do adversário. Não é o que cada um quer que conta, mas intento do outro. O dourado, na folga dada à linha, apruma para a quiçassa de tronqueiras aonde Joca sabe o destino. Os desafios empacam num empatado sem volta a espera da iniciativa do desafeto. O sol começa a ficar cansado, boceja e se prepara para puxar as montanhas mais altas sobre si, com medo do sereno, e para dormir mais justo. A conversa entre o peixe e Joca corre pela linha tensa sem se chegar à conclusão dos arremates.
            A boca da noite fechou-se e o fisgado, esperto, sabia-se mais manhoso, neste então, do que Joca, que não poderia mais ouvir os seus pensamentos no escuro, tarimbado, abandona-se manso na correnteza e deixa a linha ir se emaranhando pelas taboas despencadas ao acaso. Fincada, era só puxar a linha e arrebentar. Danou-se. Joca, conformado, desestica a luta para findar só no outro sábado. Cortou linha, recolheu tralha. Andar andeja, que a sorte se deu transversa. Tresanda as sanhas nas desavenças da beira do rio e, por último, em caminhando, resta remate de sonhar com os carinhos de Rosinha na prontidão do esperado, depois do abanhado e dos salpicos das águas de cheiro que, pelo menos aos sábados, o destino nunca deixou de provar e prover. Ah! Rosa. Rosinha; assanha que hoje é sábado.
Ceflorence 11/04/18                email cflorence.amabrasil@uol.com.br               

segunda-feira, 14 de maio de 2018


REFÚGIOS-DEUSES-INFINITOS
O paradoxo, filho carnal e incestuoso da intransigência com a mediocridade, concebido na alcova da tristeza e sob as bênçãos da solidão, não é exclusivo da filosofia existencial com que os deuses do Acanlácio Maior substantivaram o homem renegado da sua idealização saudável, paranoica, para transformar sua meta de liberdade ainda mais inexplicável e conflitiva. Tudo para lhe impor o sofrimento da racionalidade antes de enviá-lo como sapiens para desandar sobre a terra. Por que do paradoxo à relevância para a evolução da espécie? A resposta é simples e direta. Se não fosse a carência da mulher para observar de frente o esplendor do azul, impor-se em posição ereta e arvora-se ao bipedismo e, portanto, aos partos pré-maturos, para em contrapartida compensar a afronta aos deuses com os coitos frontais, salvo, tal não se dando, estas variáveis em descalabro da história às alternativas à reprodução da espécie ofereceria solução quaternária, revisionista, retrograda e o orgasmo não viria a se tornar angústia freudiana para os nascidos entre janeiro e dezembro do calendário gregoriano. São João Batista, capitulo amoroso, versículo desconhecido ou encoberto.
Este preambulo poderia ser relegado ao escrutínio, fugindo da análise acurada, não fosse a necessidade de colocar a figura humana como observadora e síntese exclusiva da existência do Antropocus Urius. Em tempos históricos em que as hordas se estraçalhavam pelas savanas, desertos e planícies dos continentes, em Urius brotou a figura híbrida do Antropocus com a finalidade de apaziguar os delírios provocados pela ansiedade, pelo erotismo e pela mentira. A origem comportamental da humanidade deve-se única e exclusivamente a estes três valores dos quais degeneraram todos os demais recalques civilizatórios emanados do Antropocus. A ansiedade é exatamente o momento do nascer em que o abandono do Éden uterino reflete o sacrifício para o salto ao desconhecido, cruel, mórbido. O erotismo é o único propulsor para a perpetuação da espécie além de outros descompassos e devaneios. A mentira é fruto da genialidade do sapiens para suportar-se e fingir que se entende.
Divagamos em prol da síntese e da racionalidade. Estes preâmbulos paradoxais e conflitivos impuseram-se não mais do que para esmiuçar a grandeza do Antropocus em sua linhagem esbelta, racionalista e relevante. Ao ser concebido para edulcorar a humanidade, ao Antropocus foi oferecida solidão profunda, com uma crista perfeita dividida em dois segmentos, contendo, na primeira, modulações externas por onde o vento recortava a oitava sinfonia e na outras pinceladas de saudades por onde o poente grená encontraria a solidão divina ao se preparar para meditar.     
Encerrando, é sobre sua pele delicada e aprazível, que o Antropocus acolhe as demências mais cativantes, alimenta as fantasias dos homens, sonha que a felicidade existe, insinua que todos são iguais perante os delírios. Ao cair da noite encanta com sua flauta mágica os imbecis, deixa adormecer os retardados, embebeda os tolos para acreditarem que o mundo encontrará a felicidade e transforma os mais afoitos em crianças para fingirem que serão felizes quando os deuses se distraírem e eles poderão trucidar o próprio Antropocus no altar da fantasia. Réquiem ao paradoxo.  
Ceflorence     02/05/18         email    cflorence.amabrasil@uol.com.br